sexta-feira, 9 de julho de 2010

Copa 2010, epílogo: A última tourada em Johannesburgo.

Brigam Espanha e Holanda
pelos direitos do mar.
O mar é das gaivotas que nele sabem voar.
Brigam Espanha e Holanda
pelos direitos do mar.
Brigam Espanha e Holanda
por que não sabem que o mar
É de quem o sabe amar.

Esta profética canção, que tem o pitoresco título de "Um Cafuné na Cabeça, Malandro, Eu Quero Até de Macaco", foi gravada por Milton Nascimento no início da década de 80, sobre um poema de Leila Diniz. Um lindo epitáfio para esta bela copa do mundo, intensa, colorida, barulhenta, surpreendente. Muito se escreveu sobre ela, sobre suas histórias - muita coisa legal você podem achar aqui, no coletivo Blog da Copa, do qual eu fiz parte.

Confesso que desde o início, acima mesmo de minha torcida (forçada) pelo Brasil, eu sonhava com uma final entre seleções que nunca haviam sido campeãs. O que eu não esperava era ter torcido tanto pelo redivivo futebol sulamericano. Argentina, Chile, Paraguai e principalmente o Uruguai me fizeram torcer muito, até as lágrimas. Além disso, várias coisas ficaram evidentes. Uma, é que a África ainda não encontrou seu caminho em campo. Apenas Gana se salvou, até o dia em que encontraram uma celeste mitológica pela proa. Depois, ficou claro que existem hoje três europas: uma nova, cheia de vida, de arte e de técnica - Alemanha, Holanda e Espanha - e outra velha, decadente, embolorada - França, Inglaterra, Itália, Portugal - e ainda uma absolutamente distante do que seja o futebol - Suíça, Eslovênia, Eslováquia, Sérvia. As seleções da América do Norte e da Ásia também pouco fizeram.

A final não foi um bom jogo. Não foi um jogo bonito. Espanha e Holanda tiveram mais defeitos que virtudes em sua última partida. O propalado toque de bola espanhol foi anulado por uma marcação implacável - e mesmo violenta - dos holandeses. Já a Holanda falhou onde era sua maior força: as finalizações mortais de Robben e Sneijder. Quando nada mais parecia funcionar, contudo, e a partida se encaminhava para a loteria dos pênaltis, a Espanha, que não desistiu de vencer um só minuto foi recompensada pelo gol salvador do irritante Iniesta. Era a estocada final, a morte do miúra laranja, o fim da tourada, o início da glória do matador. Assim se encerrava a copa de 2010, com uma seleção européia vencendo pela primeira vez fora do velho continente.

Eu, por minha vez, encerro também aqui minha função de palpiteiro, com a felicidade de ter pelo menos acertado o último jogo, inclusive contra a notícia que dava conta de que os holandeses viriam com calções pretos. Então, para os que tiveram a paciencia de me aturar durante este longo mês, fica o meu primeiro presente da noite: o luxuoso PDF com todos os jogos da copa.


Agora, deixo aqui minhas últimas opiniões sobre o torneio, com aquilo que mais me chamou a atenção no que é o meu metier: a imagem, a visão, a cena. Como 11 jogadores, onze imagens desta copa, onze imagens que mexeram com minha emoção e que vão ficar na minha memória.

Com tantas câmeras ao redor, nada poderia mesmo passar impune. O primeiro vexame, o primeiro grande erro, capturado pelos olhos de todo um planeta, este coube ao infeliz Green, goleiro da Inglaterra, no jogo contra os EUA. Um frango homérico que lhe custou a posição.


Os vice campeões de 2006 esfarelaram-se na África como um macarrón velho. De um lado, o tresloucado Domenech, o técnico do zodíaco. De outro, alguns velhos remanescentes da geração zidânica. E uma maldição fermentada por meses nos fígados irlandeses.


Em um jogo violento, um lampejo de genialidade, de uma genialidade-arte, moleque, insolente. No final, acabou não passando disso. Um lampejo.


Um craque das lentes, das câmeras, das propagandas. Em campo, um jogador pobre, de lances grotescos, de caras, bocas e ao final, arrogância e falta de educação. Triste epitáfio do belo narciso.


Um mito em campo, uma lenda fora dele. Um passa triste, de ombros caídos, sem coração e sem sangue. O outro lhe tenta acalmar. Não seria ainda a vez do mito em campo nem da lenda fora dele.


A tecnologia é pedida, é exigida. O juizão não viu o gol que Neuer, o goleiro alemão e milhões de pessoas pelo mundo, assistiram. E a Inglaterra pagou uma dívida histórica com o futebol.


A alegria albirroja de Larissa Riquelme, símbolo dos que torcem e acreditam, mesmo que sua camisa não tenha a história das outras, mesmo que seu país não tenha a glória dos outros. Porque amor é coisa que não cabe no peito, sequer na blusa.


A maior defesa de todos os tempos. Trapaça para muitos. Heroísmo para os que entendem verdadeiramente o que é este esporte, este pequeno mundo onde uma forma redonda encaixa perfeitamente entre linhas quadradas.

A cena final de um épico. O dia em que o louco não teve medo de mostrar, diante do mundo e da história, diante dos seus e dos outros, a sua própria genial e debochada loucura.


Brigam Espanha e Holanda, pelos designios do mar. O polvo, ao que parece, os conhecia melhor que todos.


O maestro da celeste é escolhido o melhor jogador da copa. E os olhos deste que vos escreve se encheram de água. Há muito um jogador não me emocionava. Obrigado por tudo, Diego.


E no grande e merecido final, a paradoxal alegria da Fúria.


E como este blog ainda é um blog de artes para futebol de botão, deixo para vocês mais dois presentes: a cartela com o jogo final da copa, entre Holanda e Espanha, e uma cartela com o uniforme espanhol já com a estrela que eles agora, podem usar por direito e que foi apresentada ao final do jogo.


Espanha x Holanda 2010 (final) - [PDF] [PNG]


Espanha campeã 2010 - [PDF] [PNG]

E aqui me despeço com uma pequena coincidência. Hoje, dia 11 de julho, o Escudinhos completa dois anos. Há exatos dois anos a primeira cartela foi publicada aqui. Que venham mais anos. E eu, peço permissão para tirar umas pequenas férias. Em agosto eu estou de volta.

Forte abraço a todos.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Copa 2010, episódio 21: De que são feitos os heróis.

Com três coisas você faz um herói: história, humildade e sangue. E foi isso que mostraram alguns times dessa copa, principalmente um: o Uruguai. Quando os jogadores da seleção celeste aterrissarem em Montevidéo na semana que vem, serão recebidos como heróis. Com justiça, porque o são. O Uruguai não é, há muito tempo, a seleção que assombrou o mundo na década de 20, com títulos olímpicos e mundiais. É uma seleção menor, com nomes de pouca expressão, a última seleção sulamericana a se classificar nas copas, hoje em dia. A seleção das repescagens. Pois esta seleção mostrou nesta copa o que é ser heróico. A semi-final contra o Holanda não foi dramática como as quartas, disputadas contra Gana. Mas foi um senhor jogo de futebol. O Uruguai desfalcado de dois de seus melhores jogadores, Suárez e Lugano, lutou com bravura e raça até o último segundo. Teve contra si, um gol irregular. Teve contra si a exaustão de seu líder, Forlán, que deu tudo o que pode e não aguentou continuar de pé em campo. E por mais que percam de sete ou oito no dia da disputa pelo terceiro lugar, voltarão para casa glorificados como a primeira celeste a chegar a uma semi-final de copa depois daquela de 1970, que era grande mas que teve a má sorte de pegar pela proa o time que escreveu seu nome na história como o melhor de todos os tempos. Fica a lição para os brasileiros. Uruguaios, argentinos e paraguaios voltaram derrotados para casa, mas chegaram à luz do dia, pela porta da frente e foram recebidos com festa e com o carinho da torcida. Dunga foi aplaudido em Porto Alegre por conta de sua história. Lúcio, Gilberto Silva e Júlio César ainda serão reverenciados por sua humildade. O resto não deu o sangue, não teve humildade e nem tem história. Chegaram na madrugada, fugiram pela porta dos fundos, com o eco dos xingamentos ao longe.

Já o jogo Espanha e Alemanha, podia ter sido um dos melhores da copa e não foi. Os meninos de Joachim Löw, só resta dizer, tremeram. A fúria cresceu na copa, seu jogo ficou consistente, a Espanha jogou com uma frieza digna dos... holandeses, vai dizer? O que me leva a crer que a final vai ser um jogo de xadrez, decidida nos detalhes, talvez com placar magro. Aposto num Uruguai x Alemanha mais animado, confesso. Ao final das contas, toda a minha torcida para a Holanda, que me deu parte de meu sangue e que historicamente, merece mais o título. O vice para os espanhóis já será o que de más grande conseguiram numa copa.

E vamos, irmãos, aos últimos palpites desta totalmente excelente copa do mundo:

...

Bom, é óbvio que meu palpite para Uruguai e Alemanha jamais seria esse. Por mim, eu colocaria a Alemanha de camisa preta e calções e meias brancas. Mas, é assim que eu acho que vai acontecer, no final das contas. Já Holanda e Espanha é mais complicado. Apesar de já ter acontecido duas vezes em copas¹, eu acho que uma seleção com camisa laranja não vai enfrentar uma de camisa vermelha neste mundial. Seria um jogo absolutamente absurdo. Então, se a Holanda é a mandante, eu creio que ela virá toda de laranja - ainda mais pela superstição, pois foi toda de laranja que ela venceu a Eurocopa de 1988. E assim, a Espanha pode ser obrigada a usar a - bela - camisa azul marinho. Podia vir com calções e meias brancas. Mas acho que virá mesmo toda de azul.

E então a gente se encontra no domingo, para encerrar a copa, ok?

¹ Holanda x Bulgária (1974) e Espanha x Paraguai (2002)

sábado, 3 de julho de 2010

Copa 2010, episódio 20: Tristeza em tangos e polcas.

Duas imagens. Duas imagens explicam perfeitamente porque é que, racionalmente, eu preferia ver os hermanos avançando na copa que os dungaboyz, por quem eu só torci mesmo porque futebol não é departamento da cabeça e sim do fígado. Ao final do jogo em que o Brasil perdeu, o que Dunga e Jorginho fizeram? fugiram para o vestiário, sem falar com ninguém, sem cumprimentar os vencedores, sem apoiar os jogadores. Que diferença para Diego Maradona, este a quem os brasileiros odeiam como se ele tivesse chutado pessoalmente cada um de seus cachorros ou cuspido em suas mães. Dieguito, El Pibe, Homem com H maiúsculo, permaneceu em campo abraçando e apoiando seus comandados e dando aos argentinos a seguinte mensagem: "recebam-nos como heróis pois eles caíram de pé". E caíram mesmo, pois os quatro gols que levaram se devem muito mais à verdadeira aula de futebol ministrada nessa tarde pela Alemanha de Schweinsteiger, Müller, Özil e Klose. A Argentina podia ter tomado de seis, sete e não sairia da copa de cabeça tão baixa quantos os brasileiros que perderam - assim como em 2006 - sem lutar, sem dar o sangue. Porque lutar e dar o sangue é coisa de jogador de futebol, e não de "guerreiros" de propaganda e estrelas do showbiz. Mas, eu falava de fígado, certo? Quantas piadas escutei hoje sobre o fato de Messi não ter marcado gol algum na copa. Mas o que jogou! Kaká, Rooney, Henry e Fernando Torres, todos ainda amargam o nada em suas contas. Mas esses não são argentinos, estão perdoados, não é mesmo?

De pé também caíram os valentes, guerreiros e briosos paraguaios. A Espanha tirou da cartola um gol sobrenatural para vencer os guaranis em sua partida mais dura nessa copa. As semifinais, afinal, são 75% européias. Agora eu me divido entre o sangue holandês que carrego e a vontade de ver os hermanos uruguaios levantarem aos píncaros a ex-Província Cisplatina.

Último palpite das semifinais e antepenúltimo até o fim da copa. Este é fácil e possivelmente será o último palpite fácil dessa copa: penso que Alemanha e Espanha virão de uniformes titulares, normalmente, a não ser que a Espanha resolva ter pruridos supersticiosos e entrar em campo de azul. A Alemanha que não costuma ter essas frescuras, vem de branco/preto/branco mesmo e é isso aí.

Até daqui a pouco.

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Copa 2010, episódio 19: O último fim de uma era.

A primeira vez que se falou em "era Dunga" foi em 1990, depois do fiasco da seleção de Lazaroni na copa da Itália. Desde então, derrotado ou vitorioso, Dunga simbolizou, nos anos que se seguiram, uma coisa que nem o brasileiro médio nem a mídia aceitavam com muita tranquilidade: o futebol feio, de marcação, de disciplina e aplicação tática, o que pode até ter trazido ao Brasil uma copa do mundo - a de 1994. Ora, de qualquer forma, convenhamos que, num país que já teve craques mágicos como Pelé, Garrincha, Leônidas, Zizinho, Didi, Zico, Romário e - vá lá... - os Ronaldos, ganhar uma copa com um meio campo que tinha Zinho e Mazinho foi até uma heresia. Mas enfim, vivemos a era dos resultados. Quem vence é herói, quem perde é um fracassado.

Só que isso não é nem nunca foi a cara e o jeito, nem do Brasil, nem do vitorioso futebol sulamericano. Essa história é coisa de americano, de WASP. Por mais que me irritasse ao extremo aquele oba-oba da copa de 2006, o monastério dos meninos de Cristo montado por Dunga e Jorginho acabou se provando falível no momento crucial. Lembrando, é claro, do implacável axioma que Renato Russo escreveu um dia: "Deus está do lado de quem vai vencer".

Agora a última "era Dunga" - a primeira parecia terminada em 1998 - se encerra. As glórias destes quatro anos serão sepultadas pelo patético cartão vermelho recebido por Felipe Melo no jogo contra a Holanda. Confesso, foi impossível, por mais críticas que eu tivesse à seleção, não torcer e não sofrer. E confesso também que meu bode maior nunca foi com o técnico, embora ele seja sim, uma pessoa intratável, descontrolada e ignorante. E nem nessa briga com a Globo eu estava do lado de alguém, pois como diz o profeta Franciel Cruz, dou um pelo outro e não quero troco. Meu bode é principalmente com o caráter fraco e questionável de alguns jogadores, principalmente as duas maiores estrelas desse time: Kaká e Robinho. Foi sobre esses dois galãzinhos de comercial que foram depositadas as esperanças da torcida brasileira por essa seleção. Porque nós nos esquecemos de quem são esses dois rapazes e o que eles já aprontaram, ou por seu desprezo às pessoas - caso de Robinho - ou por seu desprezo à seleção, quando as partidas e jogos eram menos importantes, como a copa América - caso de Kaká.

O triste é que o Brasil se ressente de algo que não possui há tempos, na verdade, desde 1970: uma seleção que jogue como o Brasil e vença. Eu creio que jamais veremos uma geração como aquela em campo novamente, como sei que nunca mais se reunirá novamente um Clube da Esquina, uma ipanema da Bossa Nova, uma Jovem Guarda, os Beatles, o Flamengo de Zico e Adílio, o Vasco de Ademir de Menezes, o Botafogo de Garrincha e Nilton Santos. Mas há de haver um time e um técnico por aí que resgatem nossa alegria, que nos remetam novamente ao futebol que só este país de pés-sujos e vira-latas sabe jogar. Que nunca nos tirem da cabeça e do coração que mais vale uma seleção como a "fracassada" equipe de 1982 que mil times de Felipe Bastos, Michel Alves, Daniel Melo e demais quejandos sem nome, passado ou futuro. Por mais que tenhamos torcido e nos vestidos de verde e amarelo, isso não era o Brasil. Que venha, então o próximo.

E claro, depois de todo esse #mimimi, e depois de ver com que RAÇA e SANGUE os uruguaios arrancaram do fundo de uma partida quase perdida a sua classificação - APRENDAM, dungaboyz! - vamos ao palpite - difícil - para a primeira das semifinais.

Como vocês perceberam, até um jogo fácil como Uruguai e Gana eu consegui errar. De qualquer modo, era uma aposta de 50%, já que qualquer dos dois uniformes de Gana dava certo contra a celeste. Gana deve ter vestido a superstição e a lembrança da vitória contra os EUA. Os ganenses lutaram muito, mas não deu. Agora, o Uruguai, depois de 40 anos, manda a primeira semifinal contra a Holanda. Não dá para vir completo porque a Holanda, a não ser que tenha uns pantalones brancos escondidos, só tem calções pretos ou azuis. Então, como ocorreu várias vezes na copa, o Uruguai vem alterado e a Holanda com o uniforme completo. Mas também pode ocorrer do Uruguai vir todo de branco. Quem garante o contrário?

Amanhã, a segunda partida das semis. E toda minha torcida para a Argentina.